Entenda neste artigo se o supervisor é cargo de confiança e se tem direito a receber horas extras.
Vou te explicar, de forma prática, como funciona o cargo de confiança para que o supervisor não receba o pagamento de horas extras.
Afinal, ninguém merece trabalhar tanto tempo sem receber corretamente pelos seus direitos, não é?
Se preferir, você pode ir direto ao ponto que te interessa clicando no índice abaixo:
Nesse artigo você vai entender:
O que é cargo de confiança na CLT?
Grande parte dos erros relacionados ao cargo de confiança ocorre porque não se entende bem o que a CLT determina sobre o assunto.
Primeiramente, é importante lembrar que o cargo de confiança é uma exceção e precisa cumprir alguns requisitos para ser válido.
Por que estou dizendo isso? Porque é muito comum a empresa promover um empregado ao cargo de supervisor, alegar que ele ocupa um cargo de confiança, até aumentar o salário, mas sem dar nenhum poder extra a esse funcionário.
Isso geralmente acontece porque algumas empresas, mal orientadas, usam essa “estratégia” para evitar o pagamento de horas extras aos seus colaboradores.
Contudo, quando falamos de cargo de confiança, é essencial observar o que diz o art. 62, II, da CLT, e o seu parágrafo único. Veja o que ele determina:
Art. 62 – Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:
II – os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.
Parágrafo único – O regime previsto neste capítulo será aplicável aos empregados mencionados no inciso II deste artigo, quando o salário do cargo de confiança, compreendendo a gratificação de função, se houver, for inferior ao valor do respectivo salário efetivo acrescido de 40%
Traduzindo esse “juridiquês”: para a CLT, gerentes, diretores, chefes de departamento e filial só não estão sujeitos à jornada de trabalho quando:
- Exercem poderes de mando e gestão; e
- Recebem um aumento salarial de pelo menos 40% sobre o salário efetivo.
Ou seja, não basta apenas promover o empregado e dizer que ele ocupa um cargo de confiança. É necessário cumprir esses dois requisitos para que o cargo de confiança seja válido de fato.
Quando o supervisor é cargo de confiança?
Primeiramente, para a Justiça do Trabalho, não importa o nome que a empresa dá ao cargo.
Em caso de processo trabalhista, o juiz vai analisar como o cargo funcionava na prática, para verificar se o supervisor realmente exercia poderes de mando e gestão.
Além disso, o contracheque será analisado para conferir se houve o aumento salarial de 40%.
Na audiência, o juiz vai querer saber, por exemplo:
- O funcionário gerenciava outros empregados ou tinha subordinados?
- Ele podia delegar e supervisionar as tarefas desses subordinados?
- As decisões dele eram constantemente revisadas por superiores hierárquicos?
- Ele tinha autonomia para tomar decisões sem depender da aprovação de gerentes ou diretores?
- O supervisor tinha acesso a informações confidenciais da empresa?
- Havia controle de jornada sobre ele?
- Ele tinha poder para aplicar punições?
- O supervisor podia contratar ou demitir funcionários?
- Nas reuniões com clientes, ele representava a empresa?
- Quando a reunião era com fornecedores, a presença do supervisor era suficiente?
- O supervisor tinha influência na definição do orçamento da empresa?
Essas são apenas algumas perguntas que ajudam a caracterizar o cargo de confiança.
Mas podem existir muitas outras atividades, e é fundamental analisar o dia a dia desse supervisor para entender se ele tinha, de fato, poderes de mando e gestão.
Portanto, o supervisor é considerado cargo de confiança quando exerce poderes de gestão e recebe um aumento salarial de pelo menos 40%. Caso contrário, a empresa deve pagar horas extras a esse colaborador.
Quando o supervisor não é cargo de confiança?
Resumidamente, o supervisor não será considerado cargo de confiança quando não tiver poder para dirigir a empresa de alguma forma e não receber um aumento de pelo menos 40% como gratificação.
No tópico anterior, eu trouxe vários exemplos de situações que podem indicar se o supervisor realmente tinha poderes de mando e gestão.
Portanto, se ele não pode tomar decisões, não delega tarefas, não supervisiona atividades e não tem o poder de aplicar punições, isso é um sinal claro de que algo está errado.
Se, ao analisar aqueles exemplos, o supervisor não se encaixar em nenhuma ou em poucas dessas condições, é importante ficar atento.
Além disso, como vou explicar no próximo tópico, descaracterizar o cargo de confiança na Justiça garante que o empregado tenha direito às horas extras que foram suprimidas.
E pode ter certeza: a condenação costuma ser pesada para as empresas quando isso acontece.
Quais as consequências de descaracterizar o cargo de confiança na Justiça?
Se tem uma coisa que faz o empregado sorrir e a empresa chorar é a descaracterização do cargo de confiança na Justiça do Trabalho.
Isso porque, quando o cargo de confiança é descaracterizado, a empresa será obrigada a pagar todas as horas extras que ultrapassarem as 8 horas diárias ou as 44 horas semanais.
Além disso, se o empregado trabalhava após as 22h, também terá direito ao adicional noturno.
Como esses cargos geralmente exigem mais de 10 horas de trabalho por dia, isso pode resultar em muitas horas extras a serem pagas ao empregado.
Ademais, como o cargo de confiança envolve um aumento de pelo menos 40% no salário, a condenação vai gerar um grande prejuízo financeiro para a empresa.
Quer um exemplo prático? Vamos lá.
Exemplo prático de descaracterização de cargo de confiança
Vamos imaginar que o João era supervisor e trabalhava 6 dias por semana, das 8h às 19h, com 1 hora de intervalo, por 3 anos na empresa. Ele tinha um salário de R$ 4.000,00 e entrou com um processo pedindo o pagamento de horas extras. E ele ganhou.
Quanto será que ele vai receber?
O primeiro passo é descobrir o valor da hora de trabalho. Para isso, dividimos o salário por 220 (número de horas da jornada mensal) e multiplicamos por 1,5 (adicional de horas extras).
Fazendo a conta:
R$ 4.000,00 ÷ 220 x 1,5 = R$ 27,27
Esse é o valor de cada hora extra com o adicional de 50%.
Agora, como a jornada legal é de 8 horas diárias, João fez 2 horas extras por dia, durante 3 anos, 6 dias por semana.
Então, a conta completa fica assim:
R$ 27,27 (valor da hora extra) x 2 (horas extras por dia) x 6 (dias por semana) x 4 (semanas por mês) x 36 (meses de trabalho) = R$ 47.122,56.
Ou seja, João teria direito a R$ 47.122,56 apenas pelo pagamento das horas extras!
Lembrando que esse valor pode ser ainda maior, caso o salário fosse superior, ou houvesse adicionais de periculosidade, insalubridade, ou se o tempo de vínculo fosse maior. Esses fatores podem aumentar significativamente o valor da condenação.
Conclusão
Toda empresa tem seus supervisores, gerentes e outros cargos que exigem um nível maior de confiança na função.
Mas quando a empresa usa essa exceção de forma errada para não pagar as horas extras dos empregados, o prejuízo acaba sendo inevitável.
Por isso, a melhor forma de entender melhor o seu cargo, se a empresa está em conformidade com a lei é conversando com um advogado trabalhista.
Assim, você terá muito mais segurança para lidar com a situação de maneira correta.
Espero ter ajudado e até a próxima!
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