Saber como descaracterizar cargo de confiança quando a empresa não respeita as regras da CLT é fundamental para receber o pagamento de horas extras.
Infelizmente sabemos que algumas empresas promovem seus empregados para alguma função de confiança apenas para não pagar as horas excedentes, mas na prática eles não possuem nenhum poder de mando.
Por isso, meu objetivo nesse artigo é te explicar o que fazer quando isso acontece e não ficar no prejuízo.
Se preferir, pode ir diretamente a um ponto específico do artigo clicando no índice abaixo.
Nesse artigo você vai entender:
O que a CLT diz sobre cargo de confiança?
Primeiramente, saiba que o cargo de confiança trata-se de uma exceção para que o empregado não se enquadre ao limite de jornada imposto pela CLT.
Lembrando que esse limite é aquele de 8h diárias ou 44h semanais, salvo as exceções, por exemplo a jornada 12×36, ok?
Dessa forma, quem ocupa uma função de confiança na empresa não precisa respeitar esses limites.
Logo, esse empregado não terá direito a horas extras, intervalo ou mesmo o adicional noturno.
Entretanto, para que esse funcionário não tenha acesso a esses direitos, é fundamental cumprir com dois requisitos essenciais:
- Possuir poderes reais de mando e gestão no estabelecimento;
- Receber pelo 40% a mais em relação ao cargo efetivo.
Caso a empresa não obedeça a esses dois requisitos ela terá sérios problemas na justiça, podendo ser condenada a pagar as horas suplementares e demais direitos relativos à jornada de trabalho.
Vamos trabalhar esses dois temas individualmente agora, para que você entenda da forma mais simples possível.
Como descaracterizar cargo de confiança por ausência de poderes de mando
Como acabei de falar, ter poderes de mando é um dos dois requisitos fundamentais para que o empregado não receba horas extras.
Contudo, é comum que empresas promovam funcionários a cargos de confiança apenas para evitar o pagamento de horas extras.
Isso é um erro enorme!
“Fulano, queremos te promover a função de supervisor e partir de hoje você não precisa mais bater ponto na empresa, pois o seu cargo é de confiança”.
Só que com o passar o tempo, a empresa começa a falar que você está saindo cedo e chegando tarde.
Quer demitir um funcionário e não consegue.
Tenta contratar um empregado e eles não deixam.
Vai aplicar uma punição e anulam o que você fez.
Agora eu te pergunto, qual poder de mando esse funcionário realmente possui? Nenhum, não é mesmo?
Pois é, caso o empregado consiga comprovar na Justiça do Trabalho, que não tinha poderes reais de mando na empresa ele vai conseguir descaracterizar o cargo de confiança.
Saiba que quem ocupa esse tipo de cargo na empresa possui a mesma representatividade do sócio.
10 exemplos de poderes de mando e gestão na empresa
Para facilitar ainda mais a sua compreensão vou citar 10 exemplo que caracterizam poderes de gestão na empresa:
-
Contratação e demissão de funcionários: Decidir sobre a contratação ou dispensa de empregados é um claro exercício do poder de mando e gestão.
-
Definição de estratégias empresariais: Estabelecer as diretrizes e estratégias para o crescimento e desenvolvimento da empresa.
-
Supervisão e controle de tarefas: Acompanhamento das atividades dos funcionários e tomada de decisões sobre a melhor forma de executá-las.
-
Determinação de metas e objetivos: Fixar metas de desempenho para departamentos ou para a empresa como um todo.
-
Gerenciamento de orçamentos: Controlar o orçamento da empresa, incluindo a alocação de recursos financeiros para diferentes áreas.
-
Negociação com fornecedores e parceiros: Realizar negociações contratuais importantes com fornecedores, clientes ou parceiros estratégicos.
-
Tomada de decisões sobre investimentos: Decidir sobre investimentos significativos, como a compra de novos equipamentos, expansão de instalações ou aquisição de outras empresas.
-
Aprovação de políticas internas: Criar, aprovar ou modificar políticas e procedimentos internos que afetam o ambiente de trabalho e a conduta dos funcionários.
-
Representação da empresa em negociações e litígios: Representar a empresa em negociações importantes, seja com sindicatos, órgãos reguladores ou em litígios.
-
Planejamento e reorganização de estruturas empresariais: Decidir sobre reestruturações internas, fusões ou aquisições, e outras mudanças organizacionais significativas.
Caso você não exerça nenhuma ou quase nenhuma dessas atividades, talvez seja um sinal de alerta de que alguma coisa esteja errada.
Por isso a melhor forma de descobrir se estão violando a CLT é procurar um advogado trabalhista.
Como descaracterizar cargo de confiança por não pagar os 40%
O outro requisito fundamental é o pagamento de 40% a mais sobre o salário efetivo para aquele empregado que exerce cargo de confiança.
Ficou difícil de entender? Calma que eu te explico de uma forma mais simples.
Para que um colaborador exerça atividade de confiança sem direito a pagamento de horas extras, ele precisa receber pelo menos 40% a mais que os demais funcionários daquele setor.
Por exemplo, de nada adianta um gerente receber cinco mil reais de salário, se os seus subordinados recebem quatro mil reais de salário.
Ou até mesmo esse mesmo valor antes dele ser promovido a gerente.
Dessa forma, é fundamental conseguir comprovar esse acréscimo salarial.
Um detalhe muito importante e que deixa muitos empregados com dúvida é se precisa constar no contracheque o pagamento da gratificação de 40%.
E a resposta é não.
Atualmente, o posicionamento da Justiça do Trabalho é de que o pagamento do adicional de 40% não precisa constar de forma específica no contracheque.
Entretanto, como disse antes, é fundamental comprovar que houve um acréscimo de pelo menos 40% em relação ao cargo efetivo.
Como provar na Justiça que não exerço realmente o cargo de confiança?
Agora que você entendeu o que caracteriza um cargo de confiança, vamos discutir como provar a ausência desses requisitos na Justiça.
Pois, sem os 40% e os poderes de mando, aquele empregado é apenas um funcionário comum que deve receber as horas extras caso passe do limite de jornada.
E agora que você já conversou com seu advogado e descobriu que na realidade não manda em nada na empresa, sabe o que fazer?
Saber como provar isso na Justiça do Trabalho?
De forma geral, testemunhas, prints do WhatsApp, áudios, vídeos e demais documentos podem ser provas importantes no seu processo.
Por exemplo, juntar o seu contracheque e o de seu subordinado que recebe quase o mesmo salário que você é uma prova importante para demostrar que a empresa não pagava os 40%.
Prints do WhatsApp onde o sócio ou seu superior fica questionando se já chegou ou saiu da empresa é uma prova de que você não tinha a liberdade necessária inerente ao seu cargo.
Ou ainda uma punição por ter aplicado uma advertência correta em um outro funcionário.
Tudo isso são provas que demostram algum indício em relação aos erros cometidos no estabelecimento.
Ademais, testemunhas são muito importantes nessas situações, pois são elas que vão demonstrar muitas vezes a habitualidade das infrações.
Ela é quem vai dizer que você não punia os funcionários, que sempre era cobrado em relação aos horários de entrada e saída, que não te via na sala de reunião quando os sócios estavam presentes e tantas outras circunstâncias.
Pronto, agora você já tem um norte em relação a quais provas deve conseguir.
Quais são meus direitos se descaracterizar meu cargo de confiança na empresa?
Quando o empregado consegue provar que não exercia poderes de mando e gestão no estabelecimento ou não recebia corretamente o acréscimo de 40% o juiz reconhece a violação da CLT e determina que o limite de jornada seja observado.
Dessa forma, o empregado terá direito a receber as verbas trabalhistas em relação a jornada de trabalho como horas extras, intervalo de almoço, adicional noturno e outros direitos da categoria.
Portanto, a empresa pagará ao empregado tudo que não respeitar o limite de 8h diárias ou 44h semanais.
No próximo tópico vou trazer um exemplo do quanto isso daria na prática.
Quanto vou receber na Justiça se provar as minhas alegações?
Tudo vai depender do que foi colocado na sua petição inicial.
Mas vamos supor que o seu salário era de quatro mil reais, trabalhou por três anos durante dez horas por dia na empresa, de segunda a sábado e o juiz determinou que fosse observado o pagamento de horas extras dentro do limite legal.
Como o empregado, salvo as exceções, não pode trabalhar mais de 8h diariamente sem receber as excedentes extras ou compensar esse período, você terá direito a 2h extras por dia, correto?
Primeiramente precisamos descobrir qual é o valor do seu salário hora com o adicional de horas extras.
Para descobrir o valor do salário hora, via de regra, pegamos o salário e dividimos por 220.
Depois, multiplicamos o resultado por 1,5 referente ao adicional de horas extras.
Então fazemos R$ 4.000,00 ÷ 220 (para descobrir o salário hora) x 1,5 (adicional de horas extras) e teremos o resultado de R$ 27,27.
Em seguida multiplicamos esse valor pela quantidade de horas extras por dia, a quantidade de dias na semana que trabalhava, a quantidade de semanas no mês e depois pela quantidade de meses que trabalhou na empresa.
Ficaria assim, R$ 27,27 (salário hora com adicional) x 2 (horas extras por dia) x 6 (dias na semana que trabalhava) x 4(quantidade de semanas no mês) x 36 (quantidade de meses que trabalhou na empresa) e o resultado será R$ 47.122,36 de horas suplementares.
lembrando que o valor pode aumentar se o salário for maior, bem como o adicional e a quantidade de horas excedentes por dia.
Portanto, não é raro encontrar casos em que as empresas foram condenadas a pagar mais de cem mil reais de horas excedentes quando o juiz descaracteriza o cargo de confiança.
Conclusão
Bem, me esforcei ao máximo nesse artigo para que você saiba como descaracterizar o cargo de confiança quando a empresa não cumpre com os requisitos da CLT.
Expliquei quais são as duas condições essenciais e como comprovar que a empresa não seguia a lei.
Além disso, trouxe quais são os direitos que você deve receber e quanto isso poderia dar na Justiça do Trabalho.
Como disse, não é raro encontrar casos em que a empresa precisou pagar mais de cem mil reais de horas extras.
Agora é com você. Caso se sinta lesado não deixe de conversar com um advogado trabalhista.
Até a próxima!
Imagem de LipikStockMedia no Freepik